19.1.07

história do design no Brasil

Na última semana em que estive de férias em Sampa, tive a oportunidade de fazer um curso de 3 dias com o Rafael Cardoso, na unidade Maria Antônia da USP. Bem conhecido por quem já estudou história do design, Rafael Cardoso [além de outros títulos] é autor dos livros Uma introdução à história do design e O design brasileiro antes do design.
Achei o curso muito interessante e resolvi colocar aqui minhas anotações... Não tive o objetivo de me aprofundar nas questões levantadas, apenas coloquei pontos interessantes para discussão...e é claro que nem tudo o que foi falado no curso está aqui [acabei dando ênfase ao que tratava do design de produtos, descartando o que foi falado sobre design gráfico. Sobre esse assunto, recomendo a leitura do livro 'O design brasileiro antes do design']


aí vai! =]


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Primeiramente o autor levanta algumas questões:

Como pensar em história do design no Brasil se não sabemos ao certo 'o que é design' e 'o que é Brasil' ?

A atividade projetual que hoje chamamos de Design já existia antes que o termo fosse utilizado. Entretanto seria um anacronismo falar em 'design' de um objeto antes da Revolução Industrial.

O conceito de 'artesanato' surgiu na era industrial; o 'artesão' era o operário
das oficinas.


ORGANIZAÇÃO INDUSTRIAL DA FABRICAÇÃO
Para caracterizar um modelo industrial, necessitamos de 4 características, em ordem decrescente de importância:

1. Divisão de tarefas, separação da etapa projetiva;
2. Ampliação da logística do fornecimento e distribuição - rede;
3. Racionalização do espaço, tempo e movimento de trabalho; 4. Mecanização/automação do processo fabril.

*As 4 características podem estar presentes, ou apenas algumas delas. Nota-se que a mecanização não é essencial para caracterizar uma organização industrial. O autor cita o exemplo dos fabricantes de tênis que até hoje utilizam mão de obra semi-escrava para costurar seus produtos à mão [nem por isso o fato de a produção ser artesanal descaracteriza o produto como como 'industrial'].

BRASIL: IDENTIDADE EM CONSTRUÇÃO
Segundo o autor, "ninguém é puramente brasileiro" (física ou culturalmente falando). Alguns podem falar "oh...mas os índios, esses sim são brasileiros", esquecendo-se do fato que os habitantes dessas terras no período pré-colonização não faziam a menor idéia do que significaria 'ser brasileiro'....provavelmente se auto-denominavam de outra forma e não devem ter gostado nem um pouco de terem sido 'abduzidos' pela nova cultura que aqui se instalou.

Portanto [e além disso], "a identidade nacional é recente e mutável", lembrando também as grandes diferenças regionais.

Existem diversas maneiras de pensar a brasilidade. O autor apresenta 3 'linhas de pensamento':
1. brasilidade nativista (romântica e nacionalista);
2. brasilidade tosca (referente à Macunaíma e ao elogio àquilo que é 'mal feito');
3. brasilidade antropofágica (de Oswald de Andrade - subversão dos valores externos).

O problema é que todas elas são péssimas para o design!
1. não podemos ser extremamente nacionalistas em um mercado globalizado;
2. um objeto industrial para consumo deve ser 'perfeito', isento de falhas funcionais ou que comprometam sua estética, portanto, o design brasileiro não poderia nunca ser 'tosco'.
3. podemos criar nosso design a partir da subversão daquilo que incorporamos de fora... Mas como criar algo originalmente brasileiro? Como livrar os produtos nacionais de serem meras cópias?

CULTURA MATERIAL
...interface com Antropologia, Arqueologia e Geografia.

O artefatos podem nos dar muitas pistas sobre as condições de fabricação, o consumo e uso em uma determinada época ou contexto. A 'arqueologia industrial' é um campo ainda muito promissor a ser explorado pela pesquisa da história do design brasileiro, tanto por meio de fontes materiais (artefatos) como fontes documentais (textos e imagens).
Segundo o autor, já existia indústria no Brasil antes da segunda metade do século XIX (1850-60). Dois exemplos citados por Rafael Cardoso são:
  • Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (1870), que já possuía 'desenhadores';
  • Arquivo Nacional, que possui registros de produtos datados no século XIX.
O autor também ressalta que algumas indústrias mantém técnicas artesanais até hoje, como é o caso do mobiliário e da construção naval, com alto grau de acabamento manual.

ERA MODERNA... a partir do século XVIII
...o design é fruto da industrialização, da urbanização e da globalização.

"No sistema industrialista tudo está interligado" e nos tornamos cada vez mais dependentes dessa 'rede'. Segundo o autor, basta passar um dia sem energia elétrica para que nos demos conta disso.
Atualmente coexistem diversos níveis de evolução tecnológica. Vemos indústrias que se aproximam do artesanato ao mesmo tempo que a tecnologia de ponta é utilizada para se explorar o 'espaço'.
Podemos dizer que a Revolução Industrial que visava a produção em larga escala, evoluiu a ponto de permitir que, hoje, existam pequenas produções, chegando inclusive à produção única, com alto nível de tecnologia (como é o caso da industria aeroespacial).

DESIGN como FENÔMENO SOCIAL
...interface com Economia, a Política e a Sociologia.

A modernidade é caracterizada por grandes mudanças sociais, estimuladas pelo avanço tecnológico:
  • a eletricidade nos proporcionou "viver à noite" [e todas as novidades que estão relacionadas a essa nova possibilidade];
  • o usuário tornou-se peça integrante da 'rede' [e dependente dela];
  • alguns desafios surgiram: "como tornar a 'invasão das máquinas' mais aceitável?" e "como se faz algo que nunca havia sido feito?";
  • os desejos se tornam necessidades e a diferença entre necessidade e desejo passa a depender do contexto (ambas se confundem).
Mas mesmo assim, não podemos falar em uma 'era moderna' homogênea. Até hoje coexistem diversos níveis de utilização da tecnologia:


inovação tecnológica X difusão da tecnologia


DESIGN em relação à PESSOA
...interface com Arte, Comunicação e Psicologia.
Emoção & Interação. Imaginário, subjetividade.

"O usuário antes de tudo é uma pessoa". E essa pessoa possui uma 'memória afetiva', que condiciona suas decisões de compra, sua auto-imagem, seu posicionamento no mundo. As embalagens são um bom exemplo de como o design pode influenciar essa 'pessoa'.

ALGUNS PROJETISTAS BRASILEIROS e seus podutos
Lorenzo Lorenzetti - chuveiro standard, 1949 Cláudio Rosa - Caloi Ceci, 1977
Mercedes Sampaio Bastos - telefone Gradiente 78DC, 1980
Percival Lafer - orelhão, 1971

Bibliograia indicada pelo autor:
ACCIOLY, Anna; FERREIRA DE ANDRADE, Joaquim Marçal; VIEIRA, Lula; CARDOSO, Rafael. Marcas de valor no mercado brasileiro. Rio de Janeiro: Ed. Senac, 2000. BORGES, Adélia. Designer não é personal trainer, e outros escritos. São Paulo: Rosari, 2002. CARDOSO, Rafael. Uma introdução à história do design. São Paulo: Edgard Blücher, 2004. CARDOSO, Rafael (org.). O design brasileiro antes do design: aspectos da história gráica, 1870-1960. São Paulo: Cosac Naify, 2005. HOMEM DE MELO, Chico. Os desafios do designer, & outros textos sobre design gráfico. São Paulo: Rosari, 2003. HOMEM DE MELO, Chico (org.). O design gráfico brasileiro: anos 60. São Paulo: Cosac Naifi, 2006. LEON, Ethel. Design brasileiro: quem fez, quem faz. Rio de Janeiro: Ed. Senac, 2005. LOSCHIAVO DOS SANTOS, Maria Cecília. Móvel moderno no Brasil. São Paulo: Studio Nobel/ Edusp, 1995. NIEMEYER, Lucy. Design no Brasil: origens e instalação. Rio de Janeiro: 2AB, 1996. PEREIRA DE SOUZA, Pedro Luís. Esdi: Biograia de uma idéia. Rio de Janeio: Ed. Uerj, 1996.


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