5.12.14

Garrafa ao mar

Te escrevo porque, por incrível que possa parecer, mesmo com a distância e as exclusões, você é a ligação mais íntima que tenho com esse novo mundo que descubro agora.
Te escrevo agora porque preciso.
Porque me deparei com o trabalho e a história de Marina e Ulay e isso me arrebatou de um jeito tal, pelo que já vivi e pelo que já sonhei... que chorei, chorei, chorei.
E depois fiquei imóvel por muito tempo.
Posso quase dizer que parei de respirar por alguns instantes. Assim como me vem um ardor nos olhos só de lembrar.
Minha filha me perguntava, ao ver a cena do reencontro deles, durante a performance, na qual ele se levanta e sai: "Por que ele foi embora, mamãe?". E a única coisa que eu pude dizer a ela foi: "Ele sempre vai embora."
"Por que ele não consegue ficar, mamãe?"
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"Não sei, filha."
Acho que eles nunca conseguem ficar.

Sinto então um daqueles poucos momentos em que algo estrutural em mim se rompe. Algo como a carta "A Torre", do tarot. Aquele ponto em que uma base que sustenta um mundo de idéias, expectativas e ações simplesmente implode. E sobram escombros e nenhum manual de montagem.

Talvez a pior das (não)emoções seja a desesperança.
Pior no sentido de que ela te leva para um estado de sanidade tão grande, que é quase insuportável.

Começo a ver no teatro (e o vejo como uma casa que abriga todo o resto das coisas com as quais já me envolvi artisticamente - dança, música, performance e design) um caminho para uma espécie de verdade, mas não é esse o nome. Algum tipo de conexão profunda com a minha própria verdade e desejo de entrega a algo indescritivelmente amplo, obscuro e ao mesmo tempo iluminado.

Te escrevo porque me senti afundar. Senti que estava indo, indo, indo...
À minha volta abriu-se um poço e precisei me agarrar em algo que me trouxesse de volta à superfície. Me veio sua lembrança, talvez como uma bússola, talvez como mais uma ilusão de inexistente âncora.
Te escrevo porque és com quem mais tenho intimidade sobre esses assuntos, embora nunca tenhamos compartilhado o mesmo tempo-espaço.
Já falei isso, eu sei.
Repito porque é tamanha a contradição.



















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